Nunca a freguesia de Água Retorta foi tão falada como tem sido presentemente. O facto deve-se ao novo acesso que se está a traçar para a Fajã do Calhau, acesso este que muitos consideram desnecessário, um atentado ambiental, um aborto, enfim, muitas coisas se dizem acerca desta estrada que á muitos anos se luta para que seja uma realidade. Gostaria de em primeiro lugar comunicar que este projecto já era debatido à quase vinte anos, quando ainda não se chegava à Fajã do Calhau de automóvel, e deste modo tentava-se arranjar uma maneira de lá chegar, não pelo Faial da Terra (actual acesso) mas sim por onde hoje a estrada está a ser construída. O facto é que se não tivesse havido um enorme desabamento na costa Sul, entre o Faial da Terra e a Fajã que cravou no mar uma massa de detritos tal, que permitiu que se traça-se sobre esta uma “estrada” que é pouco mais do que um trilho. Foi este acontecimento que possibilitou a entrada de automóveis naquela fajã. Então pergunto-me: se não houvesse desabamento alguma vez teriam um acesso a automóveis naquela fajã? Bem, a resposta é evidente. O acesso pelo Faial da Terra é perigosíssimo, quedas de pedras constantes, o mar a arrasar a estrada constantemente e já para não mencionar os gastos na sua manutenção. Chegou-se a um ponto de ser necessário uma máquina ter de desobstruir a estrada mais do que duas vezes por semana. Fazendo as contas ao longo destes anos que este acesso é passível de se transitar, não é preciso ser nenhum economista para perceber que muito dinheiro já se gastou na sua manutenção. Falemos da nova estrada, que como todos nós sabemos está muito atrasada por vários motivos. O primeiro é de facto o financeiro, o segundo dizem os entendidos que é por motivos técnicos. Não vou afiançar nem desmentir o segundo. Chamam a este acesso um atentado ambiental, mas o que vejo é muito dinheiro gasto! Mas não entremos por ai mas sim na questão ambiental. Fala-se em endemismo que se aniquilou, acho estranho que nos cerca de 50 km de costa Sul da ilha apenas haver certas espécies numa área que corresponde a cerca de 3% da costa sul. Muito estranho! Deve ser uma zona muito especial! Sejamos imparciais quanto à poluição, é certo que houve uma alteração no ecossistema local devido à terra que foi empurrada para o mar, mas haverá de certo uma recuperação a muito curto prazo. Outro aspecto é a nidificação de aves nomeadamente o cagarro, que como todos nós sabemos é uma espécie protegida.Tenho a acrescentar que um elevadíssimo número destas aves tem sido dizimada não na área que se está a construir o novo acesso, mas sim no actual, em que os carros que passam á noite perturbam estas aves e muitas vezes passam-lhes por cima, pois são cegados pelas luzes das viaturas quando se dirigem ao oceano para pescar. O que se quer dizer é que não há um impacto significativo no habitat destas aves, pelo menos que seja visível actualmente. A morfologia da costa Sul da ilha foi alterada, “o local parece saído de uma explosão nuclear”, mas dêem dez anos e já se preocuparão como manter o acesso limpo de vegetação. Haverá sempre riscos, mas seguramente serão menores do que pelo actual acesso! Foi o esforço da população e uma forte vontade de ter um acesso seguro e próximo, que tornaram este acesso uma realidade, embora ainda inacabada. Não se trata de um luxo, mas sim de uma necessidade. A população está cansada de estar vulnerável à queda de pedras, a que o mar destrua o acesso pelo Faial da terra e de ter medo de ir à sua terra! A fajã do calhau é uma herança cultural dos nossos antepassados que iam a pé por atalhos íngremes, carregados para laborar nesta terra fértil e que apesar destes sacrifícios sempre a amaram e passaram-nos um sentimento de pertença, que nos move nesta luta por um acesso bom, rápido e seguro. Sou suspeito por ser de Água Retorta, mas se não fosse hoje seria amanhã, este projecto iria avançar.